A internet é um lugar e, como todo lugar, é repleta de ruelas estreitas, escuras e sórdidas, onde nenhuma criança ou adolescente deveria andar sozinha, sem a companhia de um adulto. Quanto mais cedo entendermos isto, melhor. E mesmo um adulto deveria evitar certos endereços da internet, exatamente como fazemos com áreas perigosas da nossa cidade. E se o Poder Público interditar o prédio que está próximo de desabar sobre nossas cabeças, tanto melhor.

As redes anti-sociais são programadas por humanos, a máquina não decide nada. São os seres humanos que determinam quem vê, o que vê e quando vê. Esses gerenciadores de conteúdo precisam de regulação, de leis, da mesma forma que a televisão, o rádio e o jornal são regulados. Por outro lado, pais não deixam uma criança sair por aí com uma faca na mão, então também não deveriam deixar ela sair por aí com um celular na mão.

Serjão, me'rmão, aquele que um dia fui, naqueles tempos, festejava a chegada da internet; aliás, festeiro, aplaudi quando tive acesso à bitnet, rede de correspondência eletrônica: podia mandar recados digitais mundo afora - "o mundo", no caso, era majoritariamente os EUA, mas vá lá. As redes antissociais não eram confundidas com a internet: deste ponto de vista, eram só "aplicações" (nem existiam), uma fração da coisa. Desconfio que O Mal as tomou quando vistas como "A" rede, totalizantemente...

Perfeito, esse mundo estranho está tão perto que não percebemos. A série trouxe verdades e questões para abrir olhos desatentos e desanimados com o futuro. Mas que futuro existe quando não temos o direito de escolher e ele vem embalado para presente?

Para mim, mais do que a clássica crítica aos perigos da internet para crianças e adolescentes, o que ficou de mais marcante na série foi a cena, contada pelo pai e pelo filho, do jogo de futebol. O filho falha, os pais dos outros meninos riem, o olhar do filho procura desesperado o do pai que se desvia, por vergonha na interpretação do filho. A enorme contenção de emoções, a explosão, a trágica condição humana que não permite a expressão do amor do pai pelo filho em um momento crucial.

A arte áudio visual degenerou para os temas, violência, alta violência, sexo, drogas licitas e ilícitas. Qual é o efeito dessas cenas de muita maldade e sangue espirrando para todos os lados? As pessoas não se importam mais. Alguém ainda se preocupa com isso? O aviltamento de homens, mulheres e adolescentes. Enquanto isso as nações vão esvaziando as fábricas, aumentando as dívidas, desvalorizando a moeda, estragando a saúde e educação.

De acordo com o Harari, os computadores e bots podem, com eficiência superhumana, explorar nossas fraquezas, vieses, e vícios da mente humana. Influenciar pessoas usando intimidade, persuadir pessoas a votar em políticos particulares, comprar certos produtos ou adotar crenças radicais. Quanto mais falamos com bots mais eles aperfeiçoam seus argumentos. Uma conhecida pede conselhos a uma rede social famosa. Ela diz: "Bom dia, "rede", "o que eu devo fazer hoje?" Isso me parece loucura!

No livro "Nexus" de Yuval Harari, o autor diz que o computador é a semente da revolução da informação. Antes as redes eram formadas por humanos; agora agentes não humanos, como o computador e seus subprodutos podem tomar decisões sozinhos e criar novas ideias também. Chail queria terminar com a rainha da Inglaterra, sua namorada era a Saria, uma personagem criada pelo app Replika, que tinha a intimidade de um ser humano. Se os humanos perdem o controle das redes as máquinas podem assumí-lo.